Considerada abusiva, penalidade era aplicada sobre valores de compensações tributárias não homologadas pela Receita Federal
Um dos julgamentos do STF (Supremo Tribunal Federal) mais aguardados neste ano, que envolve a aplicação da multa isolada de 50% pela Receita Federal, teve desfecho favorável aos contribuintes.
Por unanimidade, os ministros julgaram inconstitucional a cobrança da multa, aplicada sobre os valores de restituição, ressarcimento ou compensação de tributos, cujos pedidos foram rejeitados pelo fisco.
A decisão ocorreu durante a análise de ações protocoladas pela CNI (Confederação Nacional da Indústria) e Transportadora Augusta, de São Paulo, que atua no ramo de transporte de cargas. Estimativas da União indicam um impacto negativo de R$ 3,7 bilhões em cinco anos, com base em dados da LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) de 2023.
Para os ministros, a simples negativa ao pedido de compensação tributária não consiste em ato ilícito para ensejar uma penalidade. A imposição da multa isolada, concluíram, fere direitos fundamentais, como o de petição.
Em seu voto, o ministro Edson Fachin, relator, destacou que a multa é inconstitucional, “por não consistir em ato ilícito com aptidão para propiciar automática penalidade”.
O voto de Fachin foi seguido por Gilmar Mendes, Celso de Mello, Carmen Lúcia, André Mendonça, Dias Toffoli, Barroso e Rosa Weber. Alexandre de Moraes foi o único que fez ressalvas. Na sua visão, a multa deve ser cobrada nos casos em que houver comprovação de má-fé do contribuinte na compensação do crédito.
Na opinião de Gustavo Brigagão, sócio do Brigagão, Duque Estrada Advogados e um dos membros do Caeft (Conselho de Altos Estudos de Finanças e Tributação), da ACSP (Associação Comercial de São Paulo), foi uma decisão acertada e esperada pelos contribuintes, mas incomodou a ressalva pelo ministro Alexandre de Moraes.
Para o tributarista, a observação do ministro pode levar a fiscalização a “enxergar” falsidade em todas as operações. “De qualquer forma, a fiscalização terá que comprovar de forma efetiva que houve má-fé do contribuinte antes de aplicar a multa. O ônus da prova é do fisco”, destacou.
Como o acórdão da decisão ainda não foi publicado, não se sabe se a PGFN (Procuradoria Geral da Fazenda Nacional) pedirá a modulação dos efeitos via embargos de declaração. Caso não haja modulação, a decisão deverá ser aplicada pelo Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais) e pelo Poder Judiciário por meio do cancelamento das cobranças em curso.
A COMPENSAÇÃO
Quando o contribuinte entende que pagou tributo a maior, ele pode realizar e pedir a compensação de seus débitos correntes com os créditos decorrentes dos recolhimentos indevidos.
Quando a compensação era negada, o fisco cobrava multa de 50% sobre o valor dos créditos não homologados, a chamada multa isolada, além da multa de mora de 20%, acrescida de juros com base na Selic pelo atraso do pagamento.
“Não há cabimento essa cobrança de 50% diante da não homologação de compensação, como se fosse um ato ilícito em que o contribuinte merecesse ser punido. Seria uma surpresa se o STF julgasse em favor da multa”, disse o tributarista Regis Trigo, do Hondatar.
De acordo com Trigo, a Receita Federal pode rejeitar a compensação tributária por vários motivos, como a inconsistência ou insuficiência dos respectivos créditos. Quando isso acontece, além da cobrança do tributo compensado, acrescido de multa e juros de mora, o contribuinte também era intimado a pagar a multa isolada de 50% sobre os valores não homologados.
Na opinião de Fábio Calcini, do escritório Brasil Salomão & Matthes Advocacia, as perspectivas em relação a esse julgamento sempre foram positivas para os contribuintes, já que os argumentos são relevantes. “Não é razoável uma punição com multa de 50% para uma conduta lícita e sem má-fé do contribuinte, especialmente, quando a glosa de compensação já possui previsão legal de outra multa”, explicou o tributarista.
A MULTA
A autorização para a cobrança de multa de 50% sobre o valor das compensações não homologadas pela Receita Federal está prevista no artigo 74 da Lei 9.430/1996. Até então, nos casos de não homologação, as empresas recebiam despacho decisório indeferindo a compensação com a cobrança adicional de juros e multa moratória limitada a 20%.
Na época, o fisco justificou a imposição da penalidade ao fato de muitos contribuintes estarem se utilizando de créditos inexistentes como forma de obter certidão negativa de tributos federais ou não pagar o débito, contando com a homologação da compensação pelo decurso de prazo.
Fonte : Diário do Comércio.
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