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Lojistas conseguem no Judiciário afastar multa por quebra de contrato de aluguel


Decisões levam em consideração crise gerada pela pandemia de covid-19


O primeiro movimento dos lojistas foi por desconto no valor do aluguel e mudança do índice de correção - de IGP-M para o IPCA. Agora, quem não conseguiu manter o negócio aberto, com a continuidade da crise sanitária e as incertezas no cenário econômico, tenta na Justiça escapar da multa por quebra do contrato de locação.


A crise atinge principalmente as pequenas lojas, que sofreram com queda de 70% no faturamento em 2020, na comparação com o ano anterior. A maioria dos empresários, afirma Nabil Sahyoun, presidente da Associação Brasileira de Lojistas de Shopping (Alshop), está conseguindo negociar. “Estão [os lojistas] fazendo acordos com os shoppings. Sabem que o movimento voltará ao normal”, diz.


Neste ano, segundo Aldo Macri, diretor do Sindilojas-SP, está mais fácil negociar os aluguéis. “Houve uma melhora, uma conscientização de todos”, afirma ele, lembrando que a entidade entrou com três ações para tentar baixar custos dos lojistas. “Ficar mais de 170 dias fechado, como aconteceu, afeta o faturamento.”


Mas nem sempre as negociações resolvem e o caminho acaba sendo a judicialização. Recentemente, a 31ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) confirmou a redução do aluguel de um restaurante em 50% (processo nº 10182 60-76.2020.8.26.0562) por três meses, de abril a junho de 2020.


De acordo com o relator, desembargador Paulo Celso Ayrosa de Andrade, é razoável conceder o desconto, adaptando a obrigação contratual à realidade excepcional, tendo em vista o princípio do equilíbrio contratual e a manutenção dos empregos.


Os empresários que não conseguiram manter lojas abertas tentam agora na Justiça afastar a cobrança da multa por quebra de contrato de locação. Uma joalheria conseguiu recentemente decisão favorável na 26ª Câmara de Direito Privado do TJSP.


O relator do caso, desembargador Carlos Dias Motta, considerou a pandemia um acontecimento “imprevisível, inevitável e não produzido pelas partes” e que inviabilizou a continuidade da execução do contrato. Para ele, causou desequilíbrio na relação entre a lojista e o shopping, já que havia previsão de aluguel mínimo mensal independentemente do faturamento obtido (processo nº 1005389- 41.2020.8.26.0068).


Em um outro julgamento, a 36ª Câmara de Direito Privado do TJ-SP decidiu a favor de uma loja de bijuterias. O acórdão, que reforma decisão de primeira instância, garante desconto no valor do aluguel, requerido anteriormente, e a quebra da multa contratual (processo nº 1004780-03.2020.8.26.0248).


Para os desembargadores, “o fato de as atividades comerciais de locatário de imóvel terem sido interrompidas por força da quarentena decorrente da pandemia por Covid-19 - medida fundada na Lei federal nº 13.979/2020 e no âmbito local no Decreto estadual nº 64.881/2020 - não o dispensa do pagamento dos aluguéis e encargos, mas o autoriza postular a readequação do valor real da prestação e mesmo a resolver o contrato sem arcar com a multa que nele tenha sido prevista para o caso de antecipado encerramento”.


Desconto no aluguel ainda continua na pauta dos lojistas. Recentemente, a 12ª Vara Cível de João Pessoa concedeu em tutela de urgência a uma academia redução de 30% do valor mensal Ela alegou que normas locais a obrigaram a funcionar com apenas 50% de sua capacidade, com a proibição de abertura em alguns dias (processo nº 0815010-39.2021.8.15.2001).


O contrato de aluguel foi firmado em 2015 e prevê a correção pelo IGP-M. A academia conseguiu, por acordo, reduzir o aluguel em 50% entre abril e junho de 2020 e depois em 30% entre agosto e dezembro de 2020. O novo pedido foi feito para janeiro a junho de 2021 por causa da continuidade da pandemia e das restrições de funcionamento.


Além do desconto de 30%, a decisão determina que não sejam cobrados multa, juros nem correção monetária em caso de atraso nos aluguéis. E impede a inclusão do nome da academia em cadastro restritivo de crédito por causa do pagamento com desconto.


Para o juiz substituto Alexandre Targino Gomes Falcão, com a decisão, “ambas as partes saem ganhando: a autora, por obter uma diminuição nos seus compromissos financeiros, algo extremamente importante no atual contexto pandêmico; a locadora, por ter garantida a manutenção do contrato de locação em curso, com o reequilíbrio da equação econômico-financeira”.


“O tema [redução de aluguel] segue em evidência”, afirma Daniel Cerveira, que representa a academia no processo. Segundo o advogado, às vezes os shoppings dão descontos por causa da pandemia, mas se o lojista quiser entregar a loja, tem que pagar multa. Por isso, acrescenta, novas demandas surgiram. Ele também assessora a joalheria, que conseguiu quebrar a multa contratual.


Outra discussão mantida pelos lojistas foi a troca do índice de correção -IGP-M pelo IPCA. A questão está na pauta do Supremo Tribunal Federal, por meio de ações do Partido Social Democrático (PSD) e da Confederação Nacional do Trabalhadores Metalúrgicos. Há também um projeto de lei (PL) sobre o assunto tramitando na Câmara dos Deputados (PL nº 1026, de 2021).


A discussão precisa ser pacificada, segundo o advogado Cláudio Pereira de Souza Neto, professor da Universidade Federal Fluminense. Além do efeito inflacionário da correção dos aluguéis pelo índice maior, que afeta toda a população, a judicialização leva a um problema concorrencial, já que algumas empresas conseguem decisões favoráveis e reduzem o custo do aluguel e outras não.


De acordo com Flávio Rímoli, as primeiras decisões sobre o assunto deram a impressão de que o índice seria substituído facilmente. Mas, acrescenta, na prática, não é tão simples afirmar que o Judiciário sempre vai intervir. “As primeiras respostas indicam que é o caso concreto que vai decidir pela substituição ou não do índice.”


Fonte: Valor Econômico (Editado)

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