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Tribunal autoriza plano de saúde a usar prejuízo fiscal em parcelamento federal


Pedro Teixeira de Siqueira Neto: “Faz sentido que o prejuízo que uma acumulou no passado seja usado com o débito de outra do mesmo grupo” — Foto: Claudio Belli/Valor

Com decisão do TRF da 3ª Região, questão pode ser levada aos ministros do STJ


O Tribunal Regional Federal (TRF) da 3ª Região, com sede em São Paulo, autorizou um plano de saúde a usar no Programa Especial de Regularização Tributária (Pert), parcelamento federal aberto em 2017, créditos de prejuízo fiscal e de base de cálculo negativa da CSLL de sua controladora.


A medida, não permitida pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), vale para o pagamento de débitos inscritos na dívida ativa da União. A decisão pode levar o tema ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), já que há acórdão em sentido contrário no TRF da 4ª Região, que abrange a regão Sul. Nas ações, os contribuintes alegam que foram surpreendidos por essa restrição depois de terem aderido ao Pert - abrindo mão de outros parcelamentos ou de discutir as cobranças nas esferas administrativa ou judicial.


O uso de prejuízo fiscal e base de cálculo negativa da CSLL de controladora é permitido para o pagamento de dívidas com a Receita Federal. Para o parcelamento da PGFN, não havia inicialmente esse detalhamento. Posteriormente, porém, depois do prazo de adesão ao Pert, foi publicada pelo órgão a Portaria nº 1.207/2017, que autoriza apenas a utilização de créditos próprios.


O programa federal foi criado pela Lei nº 13.496, de 2017, para o pagamento de débitos de natureza tributária e não tributária, vencidos até 30 de abril do mesmo ano. Admitiu, inclusive, dívidas que já estavam inscritas em parcelamentos anteriores ou em discussão administrativa ou judicial.


Com a publicação da norma pela PGFN em dezembro de 2017, a Notre Dame Intermédica Saúde decidiu ir à Justiça. Entrou com mandado de segurança com pedido de liminar para conseguir usar créditos de sua controladora, a BCBF Participações. Subsidiariamente, caso o pedido fosse negado, requereu que fossem anulados os atos de desistência dos parcelamentos anteriores (processo nº 5003212-25.2018.4.03.6100).


A liminar foi negada na primeira instância. A decisão, porém, foi reformada pela 3ª Turma do TRF da 3ª Região, por três votos a dois. “Entendo que, na interpretação da lei, deve-se observar além de sua letra fria, sem se deixar dominar pela preocupação de restringir, de modo a não se distanciar de suas finalidades”, afirma na decisão o relator do caso, o desembargador Nery da Costa Júnior.


De acordo com o desembargador, para assegurar a máxima efetividade da norma e tendo em vista a expressa autorização pela Receita Federal, a empresa pode usar créditos de prejuízos fiscais e de base de cálculo negativa da CSLL de sua controladora. Em seu voto, ele destaca ainda que a PGFN editou a portaria restritiva só depois do prazo final para adesão ao Pert e extrapolou os limites de sua competência.


“Portaria, como norma inferior, não tem o condão de impor restrições não previstas em lei, sob pena de ofensa ao princípio da estrita legalidade.” Em nota, a PGFN afirma que “já está atuando para a reversão do julgado” e que a lei não estabeleceu a possibilidade de utilização de créditos de prejuízo fiscal e de base de cálculo negativa da CSLL de terceiros. Alega ainda necessidade de observância do princípio da legalidade estrita, que veda a concessão de benefício não previsto em lei.


O órgão lembra que o STJ e o Supremo Tribunal Federal (STF) entendem, em inúmeros julgados, pela impossibilidade de o Poder Judiciário atuar como legislador positivo na concessão de benesses fiscais. No TRF da 4ª Região, o precedente é nesse sentido (processo nº 5019304- 58.2018.4.04.7100). Por causa da divergência entre os tribunais regionais, tanto a Fazenda Nacional quanto os contribuintes podem recorrer ao Superior Tribunal de Justiça.


A decisão envolve a Sultepa Construções e Comércio. Para a 2ª Turma, a adesão ao programa de parcelamento da PGFN deve observar seu regramento próprio. “Quando o legislador quis viabilizar a utilização de tais créditos apurados por empresas do mesmo grupo econômico, o fez expressamente, apenas para o parcelamento no âmbito da Secretaria da Receita Federal”, afirma o relator, desembargador Alexandre Rossato da Silva Ávila.


Em setembro, o ministro Benedito Gonçalves, do STJ, chegou a analisar a portaria da PGFN e entendeu que a norma não poderia determinar a perda do direito de uso de prejuízo fiscal ou base negativa da CSLL no caso de informações extemporâneas (REsp 1891654). O tema não é exatamente o mesmo das ações julgadas pelos tribunais regionais.


“Mas a discussão de fundo é a mesma”, diz o advogado Pedro Teixeira de Siqueira Neto, sócio do escritório Bichara Advogados. “Se o Congresso deu um beneficio amplo não caberia ao Executivo mitigar”, acrescenta. O uso de prejuízo fiscal de controladora é importante, segundo o advogado. Em um grupo, afirma, muitas vezes uma empresa não teve prejuízo fiscal, mas outras tiveram. E em um conglomerado, acrescenta, lucros e prejuízos são percebidos de forma mais ampla.


“Faz sentido que o prejuízo que uma acumulou no passado seja usado com o débito de outra do mesmo grupo”, diz. A decisão obtida pela Notre Dame é a primeira favorável no TRF da 3ª Região, segundo Bruno Sigaud, sócio do escritório Sigaud Advogados. Para ele, a lei do Pert foi omissa quanto ao pagamento no âmbito da PGFN e, portanto, o órgão não poderia restringir o alcance da norma, prejudicando os contribuintes.


O prazo para adesão ao Pert já foi encerrado. Por isso, afirma Sigaud, a decisão é relevante para os contribuintes que aderiram e tiveram esse pedido negado. “Temos clientes que já receberam despacho com indeferimento por serem créditos de controlada”, diz.


Fonte: Valor Econômico - Legislação

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