Em abril, o parlamento europeu aprovou o texto final da medida fronteiriça de ajuste de carbono (CBAM), que atua como um imposto/tarifa sobre carbono aplicado na fronteira, quando da entrada de certos produtos classificados como ricos em carbono, no território aduaneiro da União Europeia. A expectativa é de que o imposto passe a vigorar a partir de outubro.
O CBAM foi formulado com o objetivo de se criar um mecanismo de equivalência entre a política de precificação de carbono aplicada no mercado interno da UE e a política de precificação de carbono aplicada nas importações. Os setores alcançados pelo CBAM são: ferro, aço, cimento, alumínio e o de geração de energia.
O carbono é usado como parâmetro para quantificar os gases do efeito estufa (em emissões de dióxido de carbono equivalente CO2e) liberados durante o processo de produção dos produtos acima referidos, no exterior. Essa mecânica provê paridade entre instalações cobertas pelo mercado de carbono Europeu (EU ETS) e produtos importados, permitindo que ambos sejam medidos de acordo com as emissões reais.
O CBAM implica entrega de certificados pelos importadores com base no carbono embutido nos produtos exportados para a UE. Esses certificados não são vinculados ao sistema de licenças do EU ETS, mas refletem o preço dessas licenças para garantir uma abordagem coerente entre o preço de importação e aquele adotado no mercado europeu dentro do EU ETS. Esse ponto é importante porque significa que o importador não tem acesso ao mercado secundário do EU ETS para o comércio de créditos de carbono, o que poderia aumentar a margem de disputa sob as regras da OMC.
Colocando de lado as questões relativas à admissibilidade do CBAM como instrumento de equalização de preços, fato é que o CBAM segue a cartilha do GATT com bastante minúcia para afastar quaisquer questionamentos com base na legalidade. Uma dessas regras é que, para ser admissível, a UE deve (i) autorizar medidas compensatórias para os países que já empregam um preço sobre carbono em âmbito doméstico; (ii) permitir aos parceiros comerciais a oportunidade de demonstrar que dirigem um programa comparável e (iii) prover um crédito ou isenção proporcional ao imposto ou preço anteriormente empregado no país de origem.
Em conformidade com o acima exposto, o declarante tem direito a reclamar na declaração CBAM uma redução do número de certificados CBAM a entregar de forma a ter em conta o preço explícito do carbono pago no país de origem. Isso significa que, ao avaliar as medidas correspondentes no país de origem, na ausência de um acordo internacional para impor um conceito legal sobre o que está incluído dentro do conceito de “preço de carbono”, a UE optou, unilateralmente, por penas reconhecer correspondência sobre o preço de carbono explícito. Este caracterizado pela aplicação de um imposto sobre carbono, ou um preço praticado dentro de um mercado de carbono do tipo de compliance (como o EU ETS), desde desde que os créditos de carbono originários sejam leiloados, para que os créditos sejam de fato precificados no país de origem.
Em se tratando de um preço a menor quando comparado ao preço parâmetro aplicado na fronteira em território Europeu, a UE terá então o direito de tributar a diferença, até o patamar de tributação adotado no território comum europeu. Não havendo nenhum programa nacional para tributação ou comercialização de créditos de carbono no país de origem dos produtos, a UE passa a se intitular competente para exercer o poder de tributar no lugar do país de origem. Alguns países afetados pelo CBAM arguem se tratar de uma usurpação da soberania nacional do país de origem em matéria tributária.
Ao estabelecer esse mecanismo de compensação de preços com parceiros comerciais e econômicos, o CBAM passa a ter também a função de estimular a ação climática no exterior, com foco no estabelecimento de um preço efetivo sobre o carbono nos países com os quais a UE comercializa produtos. A imposição de um tributo sobre o carbono no país de origem importa na oportunidade de obter um benefício ambiental, mas também de acumular receitas no país de origem, sem a perda de direitos para o país de destino de tais produtos.
Dentre os países da América do Sul, a expectativa é de que o CBAM tenha um impacto reduzido, já que a Argentina, Colômbia e Chile já adotam um preço sobre carbono de cerca de USD 5,50 Kg-CO2e. O Brasil até o momento não alberga um instrumento capaz de precificar carbono em âmbito nacional. A proposta de reforma tributária (PEC 45/19) visa introduzir na Constituição a figura do imposto seletivo, mas para que esse imposto seja capaz de onerar o consumo de bens geradores de externalidades negativas, tais como dióxido de carbono, o texto proposto teria que ser revisado de modo a contemplar a incidência do imposto sobre uma base específica (por exemplo, toneladas de carbono) ao invés da base ad valorem ora proposta. Seria uma oportunidade para o governo brasileiro adotar uma medida tributária capaz de contribuir positivamente para as metas brasileiras dentro do Acordo de Paris e gerar receitas através da aplicação do conceito do poluidor pagador. Não fazê-lo agora, importa abrir mão de receita relevante, que dentre outras finalidades, poderia contribuir para o projeto de transição verde no Brasil.
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