Cármen Lúcia entende que só empresas com ações judiciais anteriores a março de 2017 podem recuperar o que pagaram a mais
Advogados afirmam que se prevalecer o voto proferido ontem pela ministra Cármen Lúcia no julgamento da chamada "tese do século" pelo Supremo Tribunal Federal (STF), será aberta brecha para uma nova onda de discussões judiciais. Isso por conta das empresas que entraram com ação para discutir a exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da Cofins depois de março de 2017 e já tiveram o processo encerrado na Justiça (transitado em julgado).
Essas companhias vêm utilizando os créditos fiscais garantidos nos seus processos para quitar tributos correntes. Mas, mesmo com uma decisão favorável em mãos, dizem os advogados, correm o risco de sofrer um revés e ter que devolver os valores já utilizados ao governo. Elas não estão contempladas na proposta de Cármen Lúcia.
A ministra, que é a relatora do caso na Corte, defende que seja aplicada a chamada modulação de efeitos e sugere como data de corte o dia 15 de março de 2017 - quando a Corte decidiu que o ICMS deveria ser retirado do cálculo. Significa que desta data para frente, todos os contribuintes podem se aproveitar da decisão. Ou seja, não precisam, dali em diante, recolher PIS e Cofins com o imposto estadual embutido no conta.
Mas cria situações diferentes em relação à recuperação dos valores que foram pagos a mais ao governo no passado, antes desta data. Aqueles contribuintes que tinham ações em curso até o dia 15 de março de 2017, teriam o direito à restituição. A União, nesses casos, precisaria devolver os valores cobrados a mais desde os cinco anos anteriores ao ajuizamento da ação.
Uma empresa que entrou com o processo em 2008, por exemplo, tem que receber de volta o que pagou de forma indevida desde 2003. Ou seja, quanto mais antiga a ação, mais créditos o contribuinte vai acumular a seu favor.
A regra muda, no entanto, para quem ajuizou ação depois do dia 15 de março de 2017. Essas empresas, pela proposta de Cármen Lúcia, não teriam o direito de receber de volta os valores que foram pagos a mais no passado. Para elas, vale a data de corte sugerida pela ministra.
Uma empresa que entrou com o processo em 2018, por exemplo, poderá recuperar o que pagou de forma indevida desde 2017 somente. Sem a modulação de efeitos, ela teria até 2013.
O problema dessa diferenciação, afirmam os advogados, é que o Supremo demorou tempo demais para decidir sobre o assunto. Os ministros decidiram pela exclusão do ICMS em março de 2017, a União apresentou recurso pedindo pela aplicação da modulação de efeitos em setembro daquele ano e desde lá - já são mais de quatro anos - o caso ficou pendente.
Nesse meio tempo, então, muitas empresas entraram com ação e obtiveram decisões transitadas em julgado. Essas decisões não impuseram a limitação de tempo e, por esse motivo, elas contabilizaram os valores pagos a mais no passado e vêm utilizando esses créditos como moeda para pagar tributos correntes.
É provável que, prevalecendo o voto da ministra Cármen Lúcia, a Receita Federal atue para travar o uso desses créditos. E, sendo assim, todos os tributos pagos com essa moeda ficariam em aberto e seriam cobrados juros e multa.
Não haveria outra saída, portanto, dizem os profissionais, senão bater, mais uma vez, à porta do Judiciário. Tributaristas ouvidos pelo Valor entendem que as decisões transitadas em julgado, que não fazem qualquer ressalva quanto à limitação de tempo, não poderiam ser afetadas pela decisão de agora do Supremo Tribunal Federal.
O julgamento sobre o alcance da exclusão do ICMS do cálculo do PIS e da Cofins continua na sessão de hoje. Ainda faltam os votos de dez ministros para que se tenha o desfecho. Esse é o processo de maior impacto financeiro em tramitação na Corte. A União prevê R$ 258,3 bilhões em perdas se tiver que devolver valores aos contribuintes.
Fonte : Valor econômico.
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